Senhor Condômino, não se Esconda Atrás do Síndico

Nesses mais de 20 anos atuando na área condominial eu me deparei muitas vezes com situações que mostraram claramente que muitos condôminos não sabem o que é e como funciona um condomínio.

Muitos acham que o condomínio é um hotel, em que o síndico é o gerente e os funcionários estão ali para atendê-los.

Na verdade, o síndico, seja ele morador ou profissional tem funções administrativas e responsabilidades que o obrigam a fazer e deixar de fazer, e não pode se preocupar com situações que não fazem parte desse escopo.

Vou tratar de duas situações que vão ilustrar perfeitamente essa questão.

Num condomínio que fazia a sua autogestão, o que eu não recomendo e tratarei desse assunto em outra postagem.

Num determinado dia, um senhor, que ajudava muito a tocar as coisas, entrou na minha sala e disse que eu e o síndico precisávamos solucionar o problema da filha dele, que morava em outra unidade, pois a moradora de cima chegava muito tarde e ficava perambulando pelo apartamento com salto alto e arrastando moveis. Ele disse que já havia falado com o síndico e ele ia ver comigo o que poderíamos fazer.

Em primeiro lugar, é bom que se esclareça que eu, esse senhor e o síndico éramos muito amigos, daqueles que iam tomar café no bar todos os dias e, por conta disso, eu falei que iria conversar com o síndico para ver o que poderíamos fazer, pois achei que a coisa estava meio estranha.

Logo depois, o síndico chegou e ele confirmou que iria tomar providência, momento em que eu o alertei de que se tratava de Direito de Vizinhança, e não Direito Condominial, e que ele tinha todo direito de tentar ajudar, mas não era sua responsabilidade. Eu e ele até fomos no apartamento dessa pessoa, tarde da noite, e verificamos que a coisa era verdadeira.

No dia seguinte do dia que verificamos o fato, chamamos o senhor e eu recomendei que a filha dele, ou seu genro fosse na delegacia e fizesse um boletim de ocorrência, e que eu e o síndico iriamos junto, como testemunhas, caso o síndico tentasse falar com a causadora do problema e a coisa não se resolvesse.

Ele ficou indignado e disse que a gente estava deixando ele “na mão”.

Eu tentei argumentar que, se o síndico aplicasse uma advertência ou multa ou fosse fazer o boletim de ocorrência, na delegacia perguntariam qual a relação dele com a unidade e, ao falar que era da filha de um amigo, não fariam o boletim, pois ele não era titular do direito de reclamar.

Não interessa como acabou a coisa, mas ficou muito claro que ele estava tentando se esconder atrás do síndico pois, em todas as alternativas que passamos para ele se recusou a se envolver ou envolver a filha na história, ou seja, tentou se esconder atrás do síndico.

O outro caso envolveu uma condômina de outro condomínio que reclamou pra o síndico que uma lanchonete ao lado do edifício ficava aberta até de madrugada, com motoqueiros fazendo barulho, etc.

O síndico me consultou e eu repeti o mantra de sempre: não custa ajudar, mas se somente ela está reclamando, não é problema do sindico.

Ele deixou passar e, dias depois, essa mesma condômina perguntou qual a providência ele tinha tomado e ele lhe contou que teve uma conversa com o proprietário do estabelecimento, o que realmente o fez e ele disse que ia tomar suas providências.

Ela disse que isso não era suficiente e que o condomínio em frente até já estava fazendo um abaixo assinado.

Esse síndico procurou o síndico desse condomínio e ele disse que não tinha nenhuma reclamação e que não estava sabendo de nada, o que fez com que ele chamasse a condômina e contasse tudo o que estava acontecendo.

No dia seguinte essa moradora começou a procurar outros condôminos e dizer que o síndico não prestava, que não resolvia os problemas do condomínio, que comia criancinhas e outras coisas.

Como se pode ver, outra pessoa que tentou se esconder atrás do síndico, pois se tivesse tomado providencias legais, em seu nome, a coisa já estaria em andamento.

Já passei por muitos casos semelhantes.

Senhores condôminos, o síndico, por mais boa vontade que tenha, tem limitações impostas pela legislação e, se for um profissional de verdade, morador ou terceirizado, jamais irá transpor essa barreira.

Vevam a vida e até a proxima.

Ivan Horcaio

Professor e palestrante com mais de 20 anos de atuação nas áreas do Direito Condominial e Direito Imobiliário, é autor de mais de 12 obras jurídicas, atuando junto a condomínios, administradoras de condomínios e imobiliárias